terça-feira, 26 de junho de 2012

FREGUESIAS E TRIBUNAIS: IDENTIDADE LOCAL E DIMENSÃO SIMBÓLICA


Portugal encontra-se num momento difícil da sua história. A imposição ao País de um vasto plano de austeridade, imposto pela Troika de financiadores abala toda a estrutura do Estado, mas também, e sobretudo, abala as estruturas sociais. Impuseram-nos não apenas a austeridade, mas mais que isso a ablação da Democracia e da Soberania, em termos tais que está em causa, para além das conquistas sociais, a própria dimensão simbólica das manifestações do Estado, tudo a coberto de um estado de excepção.

Refiro-me, claro está, à ignóbil Lei da RATA (reorganização administrativa territorial autárquica), que com critério cego, e quase exclusivamente matemático, impõe uma drástica redução de freguesias. Muitos julgam, por ventura, que as freguesias não fazem falta. Que são entes menores ou dispensáveis. Outros, alinham pelo discurso da inevitabilidade, ou do estado de excepção e assim se conformam.

As freguesias, enquanto entidade local, são a mais ancestral manifestação natural de organização social e humana. Nasceram, naturalmente, da necessidade de resolução de problemas comuns e não emanam do Estado. Antes são transcendentes à própria realidade constitucional: existem para além dela. E têm, inevitavelmente uma natureza de representação dos interesses locais junto de outras instâncias, como sejam o município ou a administração central. Mas as freguesias também encerram a dimensão simbólica da identidade e democracia local.

Muitos afastam esta dimensão natural das freguesias por oportunismo de momento. Outros porque perfilam de uma concepção totalitarista, autoritária e positivista, bem encarnada no centralismo democrático ou nos ensinamentos do Professor Marcello Caetano…

Tal como as freguesias, muitos dos tribunais existentes estão ameaçados de extinção: só em Viseu são 9, e em Lafões 2 dos 3 existentes (apenas sobrevive o de S. Pedro do Sul por uma “unha negra” de 13 processos). Para além do indesejável distanciamento da justiça relativamente aos cidadãos, os tribunais têm uma dimensão simbólica para as populações que deles se servem, bem patente nas muitas comemorações e referências históricas á criação e restauração de comarcas, quase sempre precedidas de lutas populares!

Durante o século XIX, e a pretexto de dificuldades orçamentais, também se ensaiou uma extinção massiva de freguesias, que redundou na célebre revolta da “Janeirinha”, fazendo cair o Governo e levando ao poder, entre outros, o notável Bispo de Viseu, D. António Alves Martins. O mesmo relativamente a várias extinções de Tribunais, cujo sucesso foi efémero.

Ao Presidente da República, Governo e Assembleia da República, lembro as experiências do século XIX, para que atentem na dimensão identitária e simbólica da realidade das freguesias e dos tribunais.

Aos políticos locais, rogo que sejam determinados, abandonando definitivamente essa espécie de limbo ou de esquizofrenia em que se encontram, divididos entre a fidelidade (e até eventual concordância) com os programas partidários nacionais que legitimam estas medidas e a lealdade (ou porventura calculada prudência) relativamente às populações que representam.

Ao Povo, lembro que sufragaram, por larga maioria as alegadamente inevitáveis medidas da Troika, votando no PSD, CDS e PS, que claramente definiram a aplicação destas medidas, em abstracto. E que por esse facto, são também os eleitores responsáveis pela aplicação destas medidas. A cidadania, que podem e devem exercer no combate a estas medidas comporta, também, uma dimensão de responsabilidade individual, que não pode ser apagada por discursos paternalistas proclamando que o Povo foi enganado. É reduzir as populações a uma dimensão infantil, que deforma a cidadania. A conquista e manutenção de Direitos depende, essencialmente da nossa determinação enquanto Povo!

A dimensão simbólica tem muitas expressões. Em tempo de Euro 2012, elas estão bem patentes nas manifestações à Selecção Nacional. Mas não se esgotam aqui. Encontram-se também, em diferentes escalas, nas freguesias e nos tribunais, que sustentam identidades e laços comunitários sedimentados no tempo.

Por aqui, em Lafões, amamos a liberdade que encerra a autonomia local, e no respeito por ela e pela Carta Europeia da Autonomia Local, encontra-se proposto às Assembleias Municipais de S. Pedro do Sul e de Vouzela um referendo local sobre a extinção de freguesias. Depois de votado, veremos quem tem medo da consulta popular, e quem está disposto a lutar, também, por essa dimensão simbólica!

Todos devemos lutar pela sobrevivência das nossas comunidades. Elas são inalienáveis!

Rui Costa

segunda-feira, 18 de junho de 2012

COMUNICADO DO BLOCO DE SALVATERRA DE MAGOS


PS quer enganar população do Concelho de Salvaterra de Magos e defende a extinção da Freguesia do Granho

 O PS de Salvaterra de Magos tem-se afirmado contra a lei de extinção de freguesias aprovada pelo PSD/CDS, considerando-a antidemocrática. Porém, foi o primeiro em todo o país a apresentar numa Assembleia Municipal uma proposta para aplicação daquela mesma lei.

Diz ser contra a lei e considera-a antidemocrática, mas quer ser o primeiro a comprometer um município a aplicá-la, procurando minar a unidade e a solidariedade do município na defesa de todas as freguesias.

O PS recusou que a população do concelho de Salvaterra de Magos se pronunciasse sobre o assunto e votou contra uma proposta de realização de um referendo local. Mas defendeu logo a extinção da freguesia do Granho, uma das mais afastadas da sede do município, com mais características rurais e com menos serviços públicos, precisamente uma das que mais se justifica ser freguesia.

Para além de ser uma espécie de batedor do ministro Miguel Relvas para a aplicação no concelho da lei PSD de extinção de freguesias, o PS não sabe, ou finge não saber, aplicar o que a lei quer impor contra as populações.

A proposta que o PS apresentou na Assembleia Municipal é ilegal, tecnicamente errada e não tem qualquer viabilidade. Procura convencer as populações que é possível aplicar a lei sacrificando uma freguesia, a do Granho, para salvar as restantes, mas trata-se de uma aplicação da lei completamente falsa. Intencionalmente ou por incompetência, o PS está a vender uma ilusão, um verdadeiro embuste, por várias razões.

Os lugares contíguos que abrangem mais do que uma freguesia estão definidos na lei, que não permite que freguesias passem a não urbanas por alegada descontinuidade geográfica entre os lugares urbanos. Só é permitida essa passagem se fundamentada em critérios precisos também indicados na lei --- que não incluem a descontinuidade geográfica. Portanto, dizer que Marinhais e Glória do Ribatejo podem ser consideradas como não situadas em lugar urbano “pois não existe contiguidade entre eles” é um erro e uma falsidade.

A lei exige que a proposta de passagem de freguesia urbana a não urbana seja fundamentada em termos muito precisos. Ora, a proposta do PS não indica um único fundamento para esse efeito, tornando-a absolutamente ilegal e não credível. Mais uma vez o PS mente e cria uma autêntica mistificação sobre a possibilidade das freguesias de Foros de Salvaterra e de Glória do Ribatejo não serem consideradas urbanas.

Portanto, dizer como o PS diz que no concelho poderão ser consideradas 5 freguesias não urbanas e apenas uma urbana, deduzindo-se daí que “bastaria extinguir uma para salvar as restantes”, não tem qualquer sustentação numa análise minimamente atenta da lei. Não é verdade e só pode ter como objetivo desmobilizar a luta de todos contra a extinção de qualquer uma das nossas freguesias, procurando obter ganhos partidários.

É preciso ser verdadeiro e falar claro à população do concelho de Salvaterra de Magos: quem estiver de acordo com a aplicação da lei terá de indicar pelo menos 2 freguesias a abater. O PS já indicou a freguesia do Granho, terá agora de dizer qual a segunda freguesia que vai querer eliminar.

O Bloco comprometeu-se a lutar até ao fim por todas as freguesias, sem ceder às chantagens que o governo do PSD colocou na lei, para obrigar os municípios a fazer o trabalho sujo de indicar as freguesias para extinção. O governo que o faça, sabendo-se agora que em Salvaterra terá a colaboração de um PS rendido à aplicação da lei de extinção de freguesias, à politiquice rasteira e aos meros interesses partidários.

Há ainda muito tempo, até meados de Outubro, para que a Assembleia Municipal se pronuncie sobre se está de acordo ou não com a aplicação da lei. Mas o PS é “mais papista que o Papa” e quis comprometer já o município, na última Assembleia Municipal, com a extinção da freguesia do Granho.

O PS não quer ouvir as populações das várias freguesias, não quer contribuir para a defesa solidária de todas as freguesias e não tem qualquer pudor em atacar a população do Granho e a sua freguesia. É uma manobra partidária lamentável e mesquinha, um golpe com o único objetivo de tentar ficar com o maior número de presidências de freguesias no município de Salvaterra de Magos.

Levou, inclusivamente, os presidentes de Junta de Freguesia do PS a contradizerem-se publicamente. Primeiro, todos subscreveram e entregaram na Assembleia da República uma Petição com perto de cinco mil assinaturas, em defesa da manutenção de todas as seis freguesias do concelho. Poucas semanas depois, na última Assembleia Municipal, votaram a proposta PS de extinção da freguesia do Granho, uma proposta toda ela baseada em erros técnicos e falsidades.

O Bloco de Esquerda considera que a população do nosso concelho merece todo o respeito e lealdade e condena o Partido Socialista por faltar à verdade e não cumprir a sua palavra na consulta da vontade da população.

O Partido Socialista demonstrou mais uma vez a falta de lealdade e honestidade politica ao não aceitar analisar as propostas das restantes forças políticas, no seu devido tempo.

O Bloco de Esquerda reforça a sua intenção de apresentar uma solução de pronúncia, dando resposta à lei 22/2012 de extinção/fusão de freguesias, respeitando o seu compromisso com a população do concelho de Salvaterra de Magos.

Salvaterra de Magos, 18 de Junho de 2012      
                                                                 Bloco de Esquerda de Salvaterra de Magos         

domingo, 10 de junho de 2012

Minuta de Reclamação em Caso de Não Convocação de Assembleia Municipal na Sequência de Requerimento para Realização de Referendo Local

Ex.mo Senhor Presidente da Assembleia Municipal de ……………………….



Assunto:Projeto de Deliberação para a Realização de Referendo Local


…………………………………., …………… de Junho de 2012


1 – No passado dia …… de …………… de 2012, os deputados municipais, eleitos pela BE para a Assembleia Municipal de ……………………………., apresentaram, ao abrigo do disposto no artigo 10.º, n.º 1 da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei Orgânica n.º3/2010, de 15 de Dezembro, e Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de Novembro, um Projeto de Deliberação para a Realização de Referendo Local relativamente à pronúncia da Assembleia Municipal de …………………………….., sobre a reorganização territorial autárquica a efetuar nos termos do artigo 11.º, n.º 1 e n.º 3 da Lei n.º22/2012, de 30 Maio.

2 – Recebido o projecto de deliberação pelo Presidente da Assembleia Municipal, a deliberação da Assembleia Municipal é obrigatoriamente tomada, em sessão ordinária ou extraordinária, no prazo de 15 dias após o exercício ou recepção da iniciativa referendária, caso esta tenha origem representativa, nos termos do artigo 24.º, n.º 1 da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei Orgânica n.º 3/2010, de 15 de Dezembro, e Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de Novembro).

3 – Compete ao Presidente da Assembleia Municipal convocar as sessões ordinárias e extraordinárias da Assembleia Municipal, seja a requerimento, seja por iniciativa própria, nos termos do artigo 50.º, n.º 1 e artigo 54.º, n.º 1, alínea b) da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, na sua redação atual.

4 – Compete ainda ao Presidente da Assembleia Municipal assegurar o regular funcionamento da Assembleia Municipal (artigo 54.º, n.º 1, alínea b) da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, na sua redação atual).

5 – Até ao momento não se verificou o agendamento da discussão e votação do projeto de deliberação em epígrafe, não se verificando igualmente a convocatória de sessão extraordinária para o efeito.

6 – Considerando a matéria objeto de referendo, constatamos que os prazos definidos para que a Assembleia Municipal se pronuncie sobre a reorganização territorial autárquica são muito curtos (90 dias, nos termos do artigo 12.º da Lei n.º 22/2012, de 30 de Maio), pelo que todo o tempo é precioso para o processo de decisão sobre o referendo local proposto.

Assim, vimos reiterar a necessidade de cumprimento dos prazos legalmente prescritos para a apreciação do projeto de deliberação em epígrafe, alertando Vossa Excelência para o cumprimento da legislação aplicável e para as consequências do seu não cumprimento.

Apresentamos pois, os nossos protestos de estima e consideração,

Os deputados municipais eleitos pelo Bloco de Esquerda,


BLOCO RESPONDE À LEI 22/2012 (da extinção/fusão de freguesias) COM EXIGÊNCIA DE REFERENDOS LOCAIS (ver argumentário)

Argumentário em defesa do referendo local

A/ O referendo local é uma posição de princípio
1 – Os actuais órgãos autárquicos não foram eleitos com base em qualquer proposta eleitoral de extinção ou fusão de autarquias locais. Assim, carecem de legitimidade para tomar uma deliberação desta natureza. Por isso deve-se devolver a palavra às populações.

2 – A Carta Europeia da Autonomia Local é um tratado internacional ao qual Portugal aderiu, e que vincula o Estado Português, devendo por isso ser respeitado. Diz o artigo 5.º da Carta Europeia da Autonomia Local que as populações devem ser ouvidas através de referendo, quando legalmente possível. Esta Carta Europeia da Autonomia Local é juridicamente mais relevante, e vincula mais o Estado Português que o memorando de entendimento da Troika.
3 – Ao contrário do que alguns insinuam, as freguesias não vêm da reforma administrativa de 1836. Remontam à idade média, e algumas são anteriores à fundação da nacionalidade. São realidades identitárias fortes, que não se mudam por decreto, antes carecem da anuência das populações.

4 – Há quem veja o referendo como meio de legitimação desta reforma territorial (é o caso do PCP), pelo que defende a rejeição de todos os processos de referendo local nesta matéria. Este argumento é, no mínimo, uma falta de respeito pela Democracia. A vontade das populações é para ser respeitada, ainda que ela não seja coincidente com as nossas convicções pessoais ou colectivas. Defender o referendo local é o maior sinal de aceitação dos princípios democráticos.
5 – O referendo local não pode ser visto como meio de entravar a reforma. Deve antes ser visto como uma meio de adequação dos propósitos desta reforma às necessidades das populações. Simplesmente a lei é tão má, que os seus autores e apoiantes temem os efeitos do referendo local.

6 – O PS, que ao lado da direita votou no parlamento contra um projecto de lei do BE, que visava a obrigatoriedade da realização de referendos locais nesta matéria, foi, pela voz do então Secretário de Estado José Junqueiro, o primeiro a defender uma redução substancial de autarquias. Foi o PS, igualmente, responsável pela inclusão deste item no memorando de entendimento com a Troika, apesar de agora se por à margem, não tendo sequer apresentado qualquer alternativa à proposta de lei do Governo actual. Por isso, também não lhe convém o referendo local.
B/ O referendo local nesta matéria é conforme à Constituição e à Lei

 7 – O referendo local nesta matéria é admitido por constitucionalistas como o Professor Doutor Jorge Miranda, e pela própria jurisprudência do Tribunal Constitucional (Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 390/98, n.º 113/99, n.º 518/99). É verdade que estes acórdãos se referem a uma lei do referendo local que já não está em vigor. É verdade, também, que a actual lei do referendo local veda ao referendo local a apreciação da matéria da exclusiva competência da Assembleia da República (artigo 4.º, n.º 1, alínea a) da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 21 de Agosto). Mas o que é objecto de referendo não é o exercício da competência legislativa da Assembleia da República, mas sim uma competência que a Lei n.º 22/2012 atribuiu aos órgãos das autarquias locais: pronunciar-se (no caso das Assembleias Municipais) e dar parecer (no caso das Assembleias de Freguesia) sobre a reorganização territorial autárquica.
8 – Ainda que se considere, pelos motivos expostos, o referendo ilegal, deve dar-se oportunidade para a sua aprovação. É que para a sua realização, o Tribunal Constitucional tem, obrigatoriamente de proceder à sua fiscalização (artigo 25.º da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 21 de Agosto). Assim, por mais respeito que possam merecer todos os pareceres jurídicos que surjam, a melhor forma de nos assegurarmos do seu mérito é permitir que o Tribunal Constitucional decida. E o processo está isento de custas. Por isso, nas autarquias locais, que ninguém se esconda atrás de pareceres jurídicos e da defesa da legalidade para votar contra as propostas de referendo. Se forem ilegais, o Tribunal Constitucional o dirá. Quem quiser votar contra, que o faça por razões políticas, e que assuma que não quer ouvir a população!

C/ O referendo Local é exequível, nos prazos para a pronúncia das assembleias municipais
9 – O prazo curto estabelecido pelo artigo 12.º da Lei n.º 22/2012, de 30 de Maio, de 90 dias, pode ser apontado como impossibilitando a realização do referendo local. Há que não esquecer que os prazos da Lei n.º 22/2012, de 30 de Maio, são contados nos termos do Código de Processo Civil. Significa isto que os mesmos se suspendem no período de férias judiciais, que decorrem de 16 de Julho a 31 de Agosto, permitindo assim, desde logo, o referendo local em tempo útil para a pronúncia.

D/ O referendo local custa dinheiro
10 - Este começa, infelizmente, a ser um argumento tão ridículo, como recorrente, e que tem sido utilizado para cercear a Democracia. Merece este argumento uma resposta forte e musculada…

 Bom trabalho para todos, na defesa da autonomia local!